terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Lições de uma tragédia

Prometo que está será uma das últimas vezes em que escrevo sobre a tragédia de Oruro. Ainda abalada, penso diariamente no futuro que Kevin Espalda poderia ter se, em seu primeiro jogo dentro de um estádio, não tivesse morrido de forma tão brutal.


Sim, é brutal. Já se colocaram no lugar da família dele? Vamos fazer um exercício: façam de conta que o garoto morto por um sinalizador é seu irmão ou seu filho. Bom, agora imagem a cena: ele sai de casa, com autorização dos pais, para assistir um jogo de futebol e realizar seu sonho de ver uma partida num estádio. A emoção deve ter invadido seu peito. É assim que acontece a primeira vez que estamos in loco.

O vazio no Pacaembu nos leva a repensar tudo

Bom, logo que começa o jogo você assiste à festa da torcida e pensa: ‘como isso é lindo!’. Logo aos seis minutos, seu time leva um gol do campeão do mundo. ‘Que droga! O jogo vai ser difí...’. Antes de terminar o pensamento, seu primo grita e você, simplesmente, apaga. Morreu, porque um inconsequente o atingiu com um artifício de fogo que é proibido em jogos da Libertadores pela organizadora, a Conmebol.

Em vez de haver silêncio. Os gritos de dor do seu primo se misturam com os gritos de comemoração da torcida organizada. O jogo da vida de Kevin acabou. E agora, o que resta? Dor, revolta e senso de justiça. Não seria isso o que você sentiria se tivesse acontecido com alguém de sua família?

Por incrível que pareça, a partida não foi interrompida. Os negócios do futebol falam mais alto e há dinheiro em jogo. Afinal, quanto vale a vida?!

Na última semana as discussões giraram em torno de muitas coisas: violência, segurança, punição, responsabilidade, prejuízos... Mas no fim das contas, o que realmente estamos discutindo? Kevin não vai voltar. Mas, temos como missão e honra evitar que outros percam a vida como ele.

Pressionada, a Conmebol puniu o Corinthians e afastou dos estádios a massa que o impulsiona. Perderam o clube – financeira e emocionalmente – e o torcedor comum, que só acompanha o time por paixão. Só esqueceu que ela, como entidade, também tem responsabilidade ao lado do dono do estádio, o San José. 

As organizadas, responsáveis pelas atrocidades que há décadas assistimos, continuam impunes. E agora arrumaram um menor de idade para assumir a responsabilidade. Seria ele mesmo o responsável pela morte do boliviano? Da forma como tudo foi apresentado é difícil acreditar.

A dor pela perda de uma vida inocente permanece. E a impunidade e o jogo sujo do esporte também. Afinal, nada de concreto foi – ou será feito – para evitar novas tragédias como esta. O único a pagar a pesada conta é o clube que, sim, tem parcela de responsabilidade por seu torcedor, principalmente quando o financia, como disse em alto e bom som o tio de Kevin: ‎"À medida que o Corinthians financia os integrantes de sua organizada, que não são torcedores comuns que pagam ingresso para assistir aos jogos, o clube é responsável pelo que ocorreu".

A lição disso tudo: temos que mudar! O futebol não pode ser o espaço da intolerância, da violência gratuita e da impunidade. Os gramados são espaço do espetáculo, da alegria e da paixão, e devem continuar a ser.

Para isso, todo aquele que ama este esporte e seu clube deve entoar o coro pelo fim das torcidas organizadas. Não porque fazemos generalizações e achamos que todos que pertencem a elas são ruins, mas porque em decorrência de seus erros, perdemos o encanto.

Essa foi a lição que eu tirei. E você?

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